Ações de combate à epidemia de cesáreas estão paradas na Justiça há 4 anos


Jogo de empurra entre órgãos federais ligados à saúde e entidades privadas e morosidade por parte da Justiça. Esses são alguns dos entraves encontrados nos últimos quatro anos pelo Ministério Público Federal (MPF) na tentativa - por enquanto, em vão - de reduzir os índices epidêmicos de cesarianas feitas na rede privada do país.

O Brasil é o país com maior índice de cesáreas do mundo (52%), e esse índice ultrapassa os 83% nos hospitais particulares, que atendem majoritariamente pacientes com planos de saúde.

Enquanto o índice recomendado pela Organização Mundial da Saúde é de 15%, ele chega a 90% em algumas maternidades renomadas das principais capitais do país.

Em 2010, o MPF entrou com uma ação civil solicitando que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) cumpra seu papel de regulamentar os planos de saúde e os obrigue a tomar providências para aumentar o número de partos normais e reduzir as cesáreas. O MPF pediu seis medidas (leia abaixo) que colaborariam para conter a epidemia de cesáreas.

Quatro anos depois de impetrada a ação, a Justiça ainda não se manifestou e não tem prazo para fazê-lo. Em agosto de 2013, após três anos de trâmites legais, a ação finalmente estava pronta para ser julgada, aguardando o veredicto do juiz Victorio Giuzio Neto (titular da 24ª Vara Federal, em São Paulo). Mas o juiz está de licença médica até maio e, procurado pela BBC Brasil, preferiu não fazer declarações sobre processo sob o argumento de que o julgamento da ação está pendente.

Na semana passada, a BBC Brasil publicou uma série de reportagens mostrando que a desinformação e falhas no sistema de saúde do país são os principais responsáveis pela liderança no ranking mundial dos partos cirúrgicos. Apesar de muitos dos pontos propostos pelo MP serem elogiados por algumas das entidades ligadas à saúde do país, nenhum deles foi colocado em prática. E os índices seguem crescendo.

Responsabilidade de quem?

Na ação civil, de número 0017488-30.2010.4.03.6100, o Ministério Público cobra da ANS seis medidas que ajudariam na redução do número de cesarianas e promoção do parto humanizado.

Publicação do percentual de cesáreas realizadas por médicos e hospitais conveniados a planos e pagamento de honorários diferenciados a médicos para cesáreas e partos normais estão entre as demandas do MP, que entende que essas medidas são de responsabilidade da agência.

No entanto, a ANS afirmou à BBC Brasil que nenhuma das medidas é de competência direta dela, apesar de dizer que concorda com cinco dos seis pontos propostos e até sugerir que sejam adotados pelos planos de saúde.

Associações da classe médica acusam a ANS de não cumprir seu papel de fiscalizar a atuação dos planos. Alegam que médicos fazem as denúncias, mas não têm como obrigar as operadoras de saúde a cumprir medidas que julgam razoáveis.

O jogo de empurra pela responsabilidade sobre a saúde pública brasileira amplia-se ainda mais porque o governo federal diz que a ANS é apenas um órgão vinculado ao Ministério da Saúde, que não teria competência sobre as ações da agência por causa disso.

Parte das medidas sugeridas pelo Ministério Público poderia ser tomada pelos hospitais e, outra parte, pelos próprios médicos. Mas isso não vem ocorrendo por iniciativa própria de médicos e maternidades conveniados a planos de saúde. Por isso, o MP tomou a decisão de acionar a ANS, na tentativa de fazê-la obrigar os planos a exigir tais medidas de seus médicos e hospitais.

A procuradora da República Ana Carolina Previtalli Nascimento, uma das responsáveis pela ação, disse à BBC Brasil que o MPF considera a ANS responsável por fazer com que as seis medidas (saiba mais abaixo) sejam colocadas em prática e, se não for assim, cabe ao governo federal deixar claro que setor precisa assumir a responsabilidade por cada ponto.

"A ANS vem sendo omissa em seu dever de regulamentar essa questão (das crescentes taxas de cesáreas), adotando ações educativas que são importantes, mas que estão longe de provocar mudanças efetivas no comportamento da sociedade", afirma a procuradora.

"E essa omissão total, que perdura há anos, explica bem a situação que temos hoje. O que a ANS faz (para pressionar os planos de saúde) é muito pouco, prova disso é que as taxas de cesáreas só vêm aumentando na rede privada."

Karla Coelho, gerente de assistência à saúde da ANS, refuta a acusação. "A agência está longe de ser omissa. Pelo contrário. Há dez anos trabalhamos para reduzir o número de cesáreas e em medidas para reduzir esse problema", disse.

"Realizamos diversas audiências com todas as partes envolvidas. Também criamos um comitê para discutir sobre os fatores envolvidos no parto, envolvendo todos os interessados também. É preciso enfrentar o problema em todas as frentes, pensando ações conjuntas com vários setores, como o Ministério da Saúde, os planos, as maternidades e, claro, as mulheres."

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